Projeto do TRE-SP permite que mais de 1.600 pessoas de comunidades isoladas votem

Iniciativa instituída em março de 2022 se tornou programa permanente do Tribunal; em outubro e novembro, foram visitados quatro quilombos e duas aldeias indígenas

A coordenadora de Gestão de Eleições do TRE-SP, Luna Chino, explica o funcionamento da urna elet...
A coordenadora de Gestão de Eleições do TRE-SP, Luna Chino, explica o funcionamento da urna eletrônica a crianças da aldeia Boa Vista, em Ubatuba; o registro foi feito pelo coordenador de Gestão de Imóveis do TRE-SP, Paulo Eberlein, que acompanhou a visita

Garantir que qualquer eleitora e eleitor possa exercer o seu direito de votar e de escolher os seus representantes, como é o princípio básico da democracia. Com base nesse propósito, o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) instituiu em março de 2022 um projeto para facilitar o acesso eleitoral de pessoas que vivem em locais de difícil acesso, como aldeias indígenas, quilombos, assentamentos rurais e comunidades caiçaras. Desde então, já foram atendidas 1.639 pessoas em 27 municípios do estado.

Por causa dos relevantes resultados alcançados, o Projeto de Inclusão Político-Eleitoral, lançado como um projeto-piloto, transformou-se em um programa permanente do TRE-SP. São parceiros da ação instituições como o Poupatempo, a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), a Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo (Itesp), vinculada à Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, e a Fundação Florestal, entre outras.

“A missão do Tribunal é garantir a legitimidade do processo eleitoral, e isso só é possível quando a gente tem amplas condições de participação. A intenção do projeto é ampliar essa participação, seja por meio da aproximação com as pessoas, seja por meio da emissão de documentos, garantindo a cidadania, seja apresentando a urna ou ouvindo a comunidade”, afirma a coordenadora de Gestão das Eleições do TRE-SP, Luna Chino.

Além das operações de alistamento (1º título), revisão de dados cadastrais e transferência de domicílio eleitoral de quem já possui o documento, as equipes envolvidas no projeto fazem o mapeamento desses povos e a identificação de suas necessidades para garantir o acesso ao voto. Indígenas, por exemplo, podem registrar o povo ou grupo ao qual pertencem, bem como a língua que falam. A cada visita, ainda são analisados aspectos como ações de educação eleitoral, possível instalação de novas seções ou fornecimento de transporte no dia da eleição.

Para chegar até essas localidades isoladas, em algumas ocasiões a equipe do TRE-SP já precisou recorrer a veículos com tração 4 por 4, além de barcos, devido às condições das estradas ou à longa distância das cidades. Desde o início do projeto, já foram visitados 43 assentamentos rurais, 47 aldeias indígenas, 15 quilombos e duas comunidades caiçaras em diversas regiões do estado, como Pontal de Paranapanema, Vale do Ribeira, Baixada Santista, Bauru e bairros periféricos da capital paulista, entre outros locais.

Ubatuba

Em outubro (16 a 18) e novembro (7 a 9), o programa chegou a quatro comunidades quilombolas e duas aldeias indígenas na região de Ubatuba, no litoral norte do estado: Camburi, Fazenda Picinguaba, Sertão de Itamambuca, Caçandoca e aldeias Boa Vista e Renascer. Nessas visitas, foram atendidas pela Justiça Eleitoral 87 pessoas, que fizeram operações como alistamento, transferência de domicílio e revisão de título, entre outras.

A líder comunitária do quilombo no Sertão de Itamambuca, Adriana Vieira Leite, da quinta geração de pessoas escravizadas, afirma que a visita foi muito importante para a comunidade. “A Defensoria Pública da União nos auxiliou nas questões do território, o Poupatempo com a emissão e renovação dos documentos dos menores e dos mais velhos, e o TRE com os títulos eleitorais que estavam desatualizados.”

Na aldeia Boa Vista, foi feito um atendimento a domicílio a uma jovem de 20 anos impossibilidade de locomoção, que precisava atualizar seus documentos para não perder o benefício de assistência social a que tem direito. Para chegar até ela, a equipe do Poupatempo, acompanhada pelos servidores da Justiça Eleitoral, percorreu uma trilha íngreme de 1,5 km, que atravessa um rio. A situação da jovem indígena foi resolvida.

“Participar desse projeto foi uma honra, uma experiência incrível que engrandece o nosso trabalho e nos fortalece para continuarmos em busca de garantir o acesso à cidadania para todos. Um agradecimento especial ao TRE pela nobre iniciativa, à Prodesp e ao Poupatempo pela oportunidade de participar desse projeto maravilhoso e ao apoio de vários órgãos”, afirmou o gestor de Qualidade da Prodesp, Fernando Carvalho, da Coordenadoria Regional dos Postos Poupatempo Região 4.

A indigenista Aline Batistella, da Coordenação Regional Litoral Sudeste da Funai em Itanhaém, concorda. “O projeto tem a grandeza de aproximar as instituições parceiras da realidade de cada comunidade indígena no estado de São Paulo. Além disso, o exercício da cidadania passa também pela equidade, e é isso o que observo em cada nova ação.”

A conselheira e presidente da Comissão da Verdade Sobre a Escravidão Negra do Brasil da OAB São Paulo, Rosana Rufino, acompanhou as visitas na região de Ubatuba. “A importância desse projeto para a OAB é que a gente está levando o direito para a sociedade civil. Além de só debater a importância de políticas públicas enquanto instituição, temos acessado os espaços onde essas políticas públicas são efetivadas, onde o direito muitas vezes não chega e as informações são desencontradas. Então temos uma atuação mais prática quando chegamos a essas comunidades, ouvimos a dificuldade de acesso à efetivação de direitos que eles têm e podemos trabalhar de uma forma mais assertiva dentro da instituição.”

O defensor público Gustavo Virginelli também acompanhou as visitas nas comunidades da região. “É fantástica essa integração com os demais órgãos públicos. Algum serviço que demandaria um procedimento mais burocrático pode ser solucionado ali mesmo. Isso ficou evidente no caso de um senhor que não tinha CPF e que, portanto, não poderia requerer os seus benefícios previdenciários, não poderia exercer uma série de direitos que a Constituição lhe garante. Foi constatado que ele também não tinha título de eleitor, e agora que tirou o seu título vai poder votar, o que ele nunca tinha feito na vida”, contou o defensor.

O chefe do cartório eleitoral da 144ª Zona Eleitoral – Ubatuba, Paulo Garcia, também destaca como extremamente positiva a integração entre as diversas instituições. “A integração com outros órgãos propiciou um atendimento completo às comunidades, como emissão do título eleitoral e documento de identidade ou o início de procedimento para aquisição de benefícios sociais. O cartório eleitoral já realizou atendimento itinerante em vários bairros do município em 2019, mas esse atendimento específico em comunidades tradicionais teve o seu diferencial. Percebemos a alegria, o carinho e a satisfação das pessoas que foram atendidas, o que nos motiva a atender da melhor forma possível as pessoas que buscam a Justiça Eleitoral, principalmente aquelas que têm maior dificuldade de acesso aos serviços.”

 

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