Cadastro eleitoral identifica indígenas em 111 municípios de São Paulo
Processo de identificação por etnias dos povos tradicionais foi iniciado há quatro meses; capital e Baixada Santista registraram maior presença de autodeclarados indígenas
Uma mudança no Cadastro Nacional de Eleitores, que passou a permitir a identificação por etnias, tem dado mais visibilidade aos povos indígenas de São Paulo. De novembro passado – quando foram retomadas as operações de alistamento, revisão e transferência de título – até março, 359 eleitoras e eleitores se autodeclararam indígenas no estado. Essa parcela do eleitorado aparece distribuída em pelo menos 111 municípios do estado, com maior concentração na capital (75) e na Baixada Santista: em Mongaguá (24), Itanhaém (18) e Praia Grande (16).
Além de garantir a inclusão social, a iniciativa representa um incentivo à participação política nas terras indígenas. Atualmente, os autodeclarados indígenas correspondem a apenas 0,001% do total do eleitorado paulista (34,7 milhões). De acordo com a Seção de Análise de Dados (SEAD) do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP), responsável pelo levantamento, embora a opção pela autodeclaração da etnia seja recente, as visitas do Regional a diversas localidades têm impulsionado o cadastro de povos tradicionais, entre os quais se incluem os indígenas.
A expectativa é que, nos próximos meses, haja crescimento nesse número com a continuidade do “Projeto de Inclusão Político-Eleitoral — assentamentos, povos e comunidades tradicionais do Estado de São Paulo”. A ação tem mapeado esses povos e promovido o acesso ao voto. As aldeias Tekoa Mirim, em Praia Grande; Paranapuã, em São Vicente; Cerro Corá, em Mongaguá; e Rio Branco, em Itanhaém, foram algumas das que já receberam as equipes do TRE-SP.
Desde o início do projeto, em março do ano passado, foram visitadas dez aldeias e realizados mais de 370 atendimentos, como emissão e regularização de títulos. Pelo menos outras quatro comunidades indígenas devem ser atendidas até o fim deste semestre.
Raça ou cor e etnia
Com a alteração no cadastro eleitoral, no campo sobre raça ou cor, a eleitora ou o eleitor pode se identificar como branco, preto, pardo, amarelo ou indígena. Indígenas ainda podem registrar o povo ou grupo ao qual pertencem bem como a língua que falam. Durante as visitas às aldeias, as equipes do TRE-SP colhem essas informações para alimentar o banco de dados da Justiça Eleitoral, contribuindo para o mapeamento dessa população.
A indígena da etnia Guarani-mbya (pronuncia-se bêá) Cleusa Martins da Silva, 42 anos, batizada em sua aldeia Jaxuka Mirim (“a pequena”, em sua língua nativa), foi uma das que fizeram a autodeclaração durante passagem do projeto em Itanhaém, neste mês. “Não pude votar na última eleição porque estava cuidando dos meus avós. Vim organizar [o título] porque quero votar na próxima”, afirma.
“Nosso foco foi a Baixada Santista nesses últimos meses. Depois, seguiremos para outras regiões indígenas. No segundo semestre, o plano é visitar outras populações, como quilombolas e caiçaras”, explica Luna Chino, coordenadora de Gestão de Eleições. Outras entidades, como a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Poupatempo, Fundação Florestal, Junta Militar e Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo, ligada à Secretaria de Justiça e Cidadania, apoiam o projeto.
Uma das líderes dos Guarani-mbya em Itanhaém, a professora Vanessa da Silva Paraí (significa oceano), 23, acredita que o reconhecimento dos povos indígenas pode contribuir para despertar a vida política nas comunidades. Nas Eleições 2022, apenas 13 das 3.655 candidaturas a cargos eletivos em São Paulo (0,36% do total) foram de pessoas autodeclaradas indígenas. “Precisamos de mais representantes para manter nossa cultura e tradições vivas”, comenta.
Atualmente não se sabe ao certo quantos indígenas vivem em São Paulo. O último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), publicado em 2010, apontava mais de 40.000 no estado. No início deste mês, o IBGE divulgou uma prévia do Censo 2022, mostrando um número preliminar de 1.652.876 pessoas indígenas em todo o país, entretanto não há um recorte por estados. Os dados detalhados só devem ser anunciados a partir de maio.
Resolução assegura uso da língua materna
As pessoas indígenas, quilombolas ou pertencentes a comunidades remanescentes, como qualquer outro brasileiro nato, estão obrigadas ao alistamento eleitoral e ao voto, observada a facultatividade aos analfabetos, aos maiores de 16 e menores de 18 anos e aos maiores de 70 anos.
Conforme a Resolução nº 23.659/2021, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), no tratamento de dados das pessoas indígenas, não são feitas distinções entre “integradas” e “não integradas”, “aldeadas” e “não aldeadas” ou qualquer outra que não seja autoatribuída pelos próprios grupos étnico-raciais.
Além disso, não se exige a fluência na língua portuguesa para fins de alistamento, assegurando-se a cidadãs e cidadãos indígenas o uso de suas línguas maternas e processos próprios de aprendizagem. Indígenas, quilombolas e integrantes de comunidade também ficam dispensados da apresentação de comprovante de vínculo com o domicílio eleitoral.
Segundo o Instituto Socioambiental (ISA), alguns dos povos tradicionais de São Paulo são Kaingang, Pankararu, Terena, Guarani-ñandeva, Guarani-mbya e Krenak. Além da capital e da Baixada Santista, o levantamento do TRE-SP identificou eleitores indígenas, entre outras cidades, em Ribeirão Preto, São José dos Campos, Sorocaba, Campinas, Cotia, Guarulhos, São Bernardo do Campo e Barueri.
A autodeclaração indígena pode ser feita a qualquer tempo durante as operações de alistamento, revisão ou transferência, seja presencialmente nos cartórios eleitorais ou no preenchimento do formulário Título Net, disponível na página do Tribunal na internet.
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