NOTA CONJUNTA DOS PRESIDENTES DO TJSP E DO TRE-SP
Crimes eleitorais e crimes conexos na Justiça Eleitoral: competência tradicional e repúdio a injustos desmerecimentos e agressões
Há uma semana, o Supremo Tribunal Federal (STF) reafirmou a tradicional disciplina a propósito da competência da Justiça Eleitoral. Não há dúvida sobre a perfeição técnica da decisão tomada.
No quarto Agravo Regimental no Inquérito n. 4.435/DF, o Plenário do STF, por 6 votos a 5, decidiu que a Justiça Eleitoral é a competente para processar e julgar crimes comuns conexos aos crimes eleitorais. O inquérito foi instaurado para investigar o ex-prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, e o Deputado Federal Pedro Paulo, pela suposta prática de crimes de corrupção passiva, corrupção ativa, lavagem de capitais, evasão de divisas e falsidade ideológica eleitoral. Para o Ministro relator, Marco Aurélio, a competência é da Justiça Eleitoral do Rio de Janeiro, para as infrações cometidas em 2010 e 2012; já as condutas praticadas em 2014 seriam objeto de processamento e julgamento no STF, dada a competência pela prerrogativa de foro.
Juridicamente, tanto a Constituição Federal quanto a legislação infraconstitucional estabelecem as hipóteses de competência da Justiça Federal. No art. 109, IV, da CF, prescreve-se que compete aos juízes federais processar e julgar “os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral”.
A própria Constituição Federal excepciona a competência da Justiça Federal em crimes praticados contra interesses da União, conferindo-a à Justiça Eleitoral. Vê-se que não há conflito entre lei e Constituição, mas, sim, exceção inserta no próprio texto constitucional, de modo a fazer prevalecer a competência da Justiça Eleitoral sobre aquela da Justiça Federal. Não se diz haver rol taxativo, porém a excepcionalidade mostra que a Constituição trouxe, em seu texto, também a competência da Justiça Eleitoral, ainda que a contrario sensu.
A Justiça Eleitoral é Justiça especializada, que vela pelo princípio democrático e garante a lisura do pleito eleitoral. Mas não só. A par da função administrativa de realização das eleições encontra-se a função jurisdicional, desempenhada a contento desde a sua criação, em 1932.
Especificamente quanto à competência da Justiça Eleitoral, a Constituição Federal dispôs que será definida por lei complementar (artigo 121, caput). A Lei n. 4.737/65, que instituiu o Código Eleitoral, foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988 como Lei Complementar, podendo, por isso, dispor sobre a competência dos juízes eleitorais. Em seu art. 35, II, diz que compete aos juízes eleitorais “processar e julgar os crimes eleitorais e os comuns que lhe forem conexos, ressalvada a competência originária do Tribunal Superior e dos Tribunais Regionais”.
A literalidade do dispositivo é suficiente para concluir ser a Justiça Eleitoral competente para processar e julgar os crimes eleitorais e os comuns conexos a eles.
Ademais, o Código de Processo Penal, em seu art. 78, IV, dispõe que, para determinar a competência por conexão ou continência, havendo concurso entre jurisdição comum e especial, prevalecerá a especial. Como já se estabeleceu, a Justiça Eleitoral possui jurisdição especializada, por isso sua competência prevalece sobre a das Justiças Comuns (Estadual e Federal) quando houver conexão entre crimes eleitorais e crimes comuns.
Outrossim, é importante ressaltar que a Justiça Eleitoral não irá, necessariamente, ficar com todos os processos criminais envolvendo crimes eleitorais e crimes comuns; a regra estabelecida pelo legislador é bastante clara nesse ponto: somente haverá processo e julgamento pela Justiça Eleitoral em caso de conexão entre crimes eleitorais e crimes comuns, conexão esta que será aferida exclusivamente pelo órgão competente da Justiça Eleitoral. Não havendo conexão, restituem-se os autos ao juízo de origem, simplesmente.
Não há de se duvidar, por outro lado, da capacidade estrutural da Justiça Eleitoral, em que pese vozes tenham se posicionado diferentemente. A Justiça Eleitoral de São Paulo é amparada por mais de 3.500 servidores e 393 juízes eleitorais, além de estagiários e servidores cedidos das prefeituras municipais e do governo do Estado de São Paulo.
Com esforço, as eleições e os julgamentos estão, como antes, sempre a tempo e hora. A Justiça Eleitoral é tida como a mais célere e eficiente das Justiças Brasileiras, não havendo qualquer razão para que perca essa celeridade e essa eficiência. Obviamente, se houver aumento repentino do serviço, haverá o consequente ajuste necessário em relação aos meios materiais e humanos, incluindo juízes e servidores.
O Tribunal de Justiça de São Paulo sempre esteve ao lado do Tribunal Regional Eleitoral Paulista e acompanhará, como tem acompanhado, todas as necessidades para que os serviços sejam eficazmente realizados, a tempo e a hora. O Tribunal de Justiça de São Paulo, por esta manifestação, reafirma seus laços com as Justiças Eleitorais Paulista e Brasileira.
Não custa reafirmar que os juízes eleitorais são juízes estaduais, compondo, em São Paulo, o maior Tribunal de Justiça do Brasil e, quiçá, do mundo. São todos e todas, juízes e juízas, estaduais, aprovados em certame de alto nível e complexa dificuldade jurídica, com expertise em diversos ramos do direito, em especial o eleitoral, que lhes é assegurado em sistema de rodízio constitucional que muito bem tem servido à renovação e ao bom desempenho das atividades eleitorais. São todos afeitos a causas simples e complexas, cíveis e criminais, sem qualquer tipo de despreparo.
Também os promotores e as promotoras eleitorais são oriundos dos quadros do Ministério Público Estadual, demonstrando igual comprometimento e técnica jurídica aptos a lidar com as relevantes questões postas nos feitos eleitorais.
A polícia judiciária eleitoral, por sua vez, é a própria Polícia Federal, a quem incumbe investigar também os delitos eleitorais, de modo que nenhuma alteração, nesse mister, ocorrerá quando os inquéritos forem deslocados à Justiça Eleitoral.
Por todo o exposto, fica nítido que a Justiça Eleitoral, não só juridicamente, mas também pragmaticamente, é o palco constitucionalmente ideal para processar e julgar os crimes eleitorais, além dos conexos a eles.
Os ataques que lhe são dirigidos nestes dias são fruto de injustas agressões e originárias de interesses subalternos ou monetários. Nosso compromisso é com a democracia representativa brasileira e com a coletividade. Nosso agir, como sempre, está na ética e na aplicação da Justiça.
Manoel de Queiroz Pereira Calças | Carlos Eduardo Cauduro Padin |
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Presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo | Presidente do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo |